O pessimismo tomou conta. Decepcionados com a reação do governo à derrota eleitoral de 28 de junho, economistas argentinos já não acreditam em retomada da atividade econômica e no fim da recessão na qual, segundo eles, o país já está mergulhado. Havia uma expectativa de que a presidente Cristina Kirchner anunciasse medidas para corrigir os rumos da economia, abalada desde o ano passado pelo aumento da inflação, a queda das exportações pela crise internacional, a seca que reduziu a safra agrícola em 30% e a recente paralisação da atividade econômica pelo surto de gripe suína.
Mas as mudanças anunciadas até agora, 25 dias depois das eleições, não passaram de uma dança de ministros de dentro do próprio governo, sem qualquer figura nova que arejasse o gabinete. Houve, sim, um chamado ao diálogo com a oposição, demanda tanto de empresários quanto de políticos aliados e oposicionistas. Concretamente, o diálogo está em curso, mas até agora não rendeu frutos.
"Os sinais negativos continuam, portanto a Argentina vai continuar em recessão", afirma o economista José Luis Espert, da consultoria econômica Espert & Asociados, referindo-se à queda dos investimentos, da atividade industrial e comercial e a fuga de capitais. Ele estima que o Produto Interno Bruto (PIB) do país para todo o ano de 2009 será negativo entre 4% e 4,5%, deixando para trás, definitivamente, os cinco anos de crescimento "chinês" da Argentina encerrados em 2008.
"Todos os indicadores mostram que a Argentina já está em recessão, inclusive os do setor público", diz o economista Aldo Abram, diretor executivo do Centro de Estudos Institucionais e de Mercados (Ciima), entidade que assessora universidades.
Um dos maiores problemas, na visão destes economistas, é justamente as estatísticas. Os números oficiais não coincidem com os calculados pelas consultorias privadas nem com os das universidades e governos provinciais devido a uma suposta manipulação de estatísticas no Indec, órgão equivalente ao IBGE. A independência do órgão era uma das reivindicações dos agentes econômicos e foi tema da campanha contra o governo nas últimas eleições legislativas. Mas terça-feira, quando o novo ministro Amado Boudou anunciou mudanças no Indec, foi uma decepção generalizada. A criação, no futuro, de dois conselhos consultivos de apoio ao órgão e a troca de seu diretor de estatísticas deixou a impressão de que, na verdade, nada mudou.
Com o panorama atual, uma ameaça paira no país: o setor público. De acordo com os últimos dados oficiais divulgados na segunda semana de julho, nos últimos 12 meses encerrados em maio de 2009 o superávit fiscal primário do governo nacional baixou de 6,026 bilhões de pesos para apenas 669 milhões. Enquanto as despesas públicas subiram 28,1%, a arrecadação subiu apenas 8,9% no mesmo período. A poupança (antes do pagamento de juros da dívida) de 12,5 bilhões de pesos registrada nos cinco primeiros meses de 2008 se transformou em um déficit de 94 milhões no mesmo período deste ano. É o pior resultado das contas públicas argentinas desde a crise de 2001.
Ao assumir o cargo, há 15 dias, o ministro Boudou garantiu que uma de suas tarefas primordiais seria recuperar o superávit primário das contas públicas. E também disse que não haverá corte de gastos, já que o modelo econômico implantado pelo casal Kirchner em 2003 " e que não será alterado nem com a perda de apoio político " prevê a injeção de recursos públicos para sustentar a demanda e a atividade econômica. A dúvida é: de onde vão tirar o dinheiro para recuperar o superávit, se a arrecadação de impostos não para de cair por conta da recessão? (que o governo não admite oficialmente). Nos últimos dias têm surgido rumores de que seria lançado um bônus novo para ser comprado pelos bancos, enxugando a liquidez que ainda é alta no sistema financeiro.
Os únicos sinais positivos vêm de fora, com o inicio da recuperação da economia mundial, dos preços de exportação dos principais produtos argentinos e principalmente do Brasil, maior sócio comercial – segundo os fabricantes de automóveis, as vendas de veículos para o Brasil aumentaram 30% em junho. "Se o governo fizer as reformas pendentes é factível pensar em que (a presidente Cristina Kirchner) termine seu governo com o país em crescimento", aconselhava o economista Rogelio Frigerio, da consultoria Economia & Regiones.